PREÂMBULO
Este estudo pretende salientar a diferença entre três momentos distintos na evolução das danças afro-cubanas de cariz religioso em Cuba: o momento ritual, o momento teatral e o momento pedagógico. Pretendo com esta obra, por um lado, disponibilizar informação – actualmente inexistente em Portugal – sobre as danças afro-cubanas nas suas diferentes vertentes e, por outro, descrever o processo de transmissão e teatralização que contribuiu para a preservação das mesmas ao longo do tempo. Estas danças foram divulgadas na Europa de forma muito livre e, sobretudo, em contextos artísticos de carácter comercial como festivais de danças latinas, onde é comum encontrar uma reprodução de excertos destas danças na vertente mais exagerada e espectacular, e onde não se tem tempo nem, por vezes, interesse em conhecer o contexto sociocultural destas representações artísticas.
Para o estudante interessado no percurso teórico e para colmatar as lacunas deixadas pelas poucas aulas com profissionais informados, existe apenas a possibilidade de leitura de textos teóricos de carácter geral, que poderão não esclarecer as dúvidas de um observador externo perante a complexidade das diferentes culturas envolvidas no processo.
É também minha intenção informar o leitor sobre a construção de técnicas específicas pela formação de bailarinos aptos para a interpretação destas específicas formas de dança, esclarecendo as circunstâncias da criação da técnica de dança cubana, já mundialmente conhecida, e identificando os elementos que têm confluído na sua composição. Este tema apresenta, hoje em dia, um duplo interesse: para além de dar aos dançarinos instrumentos para enriquecerem a sua própria interpretação, o sistema de formação artística concebido em Cuba constitui um exemplo que poderia ser aplicado a qualquer “vocabulário de dança”1 de origem africana, ajudando na descodificação e classificação de códigos simbólicos em constante risco de desaparecimento e na criação de uma pedagogia apropriada para a transmissão de cada um.
É para mim um estímulo pensar que o trabalho feito em Cuba possa ser considerado paradigmático no incentivo ao desenvolvimento de uma cultura artística nos próprios países africanos que, tendo escasso registo do material tradicional autóctone, acabam, por vezes, por perder a representatividade das próprias culturas. Esta condição, muitas vezes, acaba por favorecer artistas estrangeiros dotados de melhores recursos técnicos que, embora procurem aproximar-se da estética da dança escolhida, não conseguem transmitir o valor sociocultural que o dito código simbólico carrega, determinando assim um processo de progressiva esteticização e descontextualização das danças e, obviamente, a perda do carácter espiritual que as danças africanas muitas vezes encarnam.
O meu interesse por este tema nasce da observação da surpreendente qualidade cénica dos bailarinos folclóricos cubanos, da riqueza do vocabulário cinético que estes possuem, da capacidade de “independização” e coordenação de movimentos diferentes com partes do corpo que acompanham, ao mesmo tempo, padrões rítmicos distintos, em conjunto com uma definição e limpeza do movimento que não parece típica das danças de origem africanas.
Estas observações e a crescente admiração por estas danças foram o estímulo para empreender várias viagens a Cuba, com a intenção de elaborar pesquisas nas instituições de ensino artístico da capital, e contactar os melhores professores do âmbito folclórico. A finalidade foi observar in loco a pedagogia praticada, analisar a estrutura dos cursos e compreender quais os elementos fundamentais para a criação de uma base técnica funcional, não apenas à reprodução dos movimentos mas também à reprodução controlada da dinâmica e da estética dos mesmos enquanto gestos dramaturgicamente significativos, associando um critério de qualidade estética à qualidade representativa da movimentação de matriz africana. Sobre o último ponto proponho, nesta obra, uma análise ainda sintética e superficial, requerendo-se para um mais amplo desenvolvimento deste tema uma escrita dedicada, de carácter monográfico e baseada numa análise técnica específica.
Para poder responder à curiosidade do leitor que não tenha conhecimento específico da cultura performativa cubana, decidi iniciar este volume com uma síntese dos principais processos históricos e socioculturais que tiveram influência na paisagem artística cubana actual, no intento de ajudar o dançarino, sobretudo na fase inicial de aprendizagem, a diferenciar as tipologias de representação folclórica existentes e a escolher o tipo de linguagem performativa que quer reproduzir na sua dança.
A parte central do volume é dedicada à apresentação das diferentes danças religiosas afro-cubanas divididas por “ciclos” e sinteticamente apresentadas com as características mais evidentes. A última parte aborda o processo de absorção das raízes culturais africanas e a sua integração num sistema de ensino oficial, bem como as suas representações públicas e as transformações ocorridas no género, analisando de forma mais aprofundada todo este processo enquanto fenómeno de reapropriação cultural, introduzindo-se a técnica das danças e apresentando-se algumas instituições de ensino.
Reúnem-se neste estudo diferentes instrumentos metodológicos de forma a oferecer uma visão geral sobre o tópico escolhido: entrevistas, desenvolvidas em Havana em Setembro de 2016 e Agosto de 2017; apreciação das metodologias do ensino local nas diferentes instituições; análise dos resultados expostos nos espectáculos teatrais, observados quer ao vivo quer em gravações.
Como ponto de partida teórico deu-se prioridade às fontes bibliográficas sobre a história de Cuba e a cultura afro-cubana, sobretudo as de carácter socio-antropológico, juntando a estas os estudos seminais sobre o valor simbólico do gesto, sobre performance e o conceito de ritual, e textos especificamente dedicados à dança no contexto pós-colonial. Daqui partiu-se para uma análise essencialmente performativa do repertório artístico cubano de matriz folclórica, procurando também compreender a especificidade do conceito de folclore, divulgado em Cuba nos textos críticos pré e pós-revolucionários, utilizado numa vertente aparentemente sempre positiva e nunca questionado criticamente. No conjunto deste processo de estudo, o elemento mais útil para a compreensão das danças foi a observação das cerimónias – uma possibilidade excepcional que se proporcionou graças aos professores que me convidaram e acompanharam de forma incansável: cada experiência foi fundamental para a compreensão da atitude física apropriada para a execução do movimento no contexto da performance espontânea, e da importância de uma postura psico-física específica que constitui o elemento imprescindível para estas danças.
Para além da divulgação das danças afro-cubanas enquanto património cultural da humanidade, este estudo aborda criticamente o seu processo de patrimonialização no contexto da definição da identidade sociopolítica de Cuba, um tema ainda não abordado do ponto de vista especificamente artístico e que, nos últimos anos, tem despertado o interesse de várias instituições internacionais que reconhecem o intrínseco valor de Cuba como lugar de preservação e valorização da cultura de raiz africana. Neste sentido a UNESCO elegeu, em 2008, a Tumba Francesa e, em 2016, a Rumba Cubana como património imaterial da Humanidade, reconhecendo as múltiplas influências culturais e salientando o valor comunitário de ambas as danças com o intuito de promover a sua preservação e divulgação. Se, por um lado, este reconhecimento levou a uma maior fama da cultura cubana, por outro, reconhecer a dança como património imaterial acaba por ser uma definição quase oximorónica: ao considerar a dança uma entidade abstracta, enquanto esta, na realidade, não só se encarna em corpos dançantes, mas os revela graças à força da incorporação duma memória cultural.
Em resposta à difusão deste tipo de abordagem à dança – consequência de um pensamento abstracto e desligado de qualquer noção do corpo como arquivo cultural vivo – este estudo teve o cuidado de aproveitar uma metodologia variada e de não se identificar com um domínio de estudos específico, a não ser o dos estudos culturais e da performance. O uso que nele se faz das entrevistas e dos textos bibliográficos é quase literário, de citação, sem com eles querer demonstrar qualquer verdade objectiva, mas apenas pretendendo expor experiências que nunca serão exaustivas, mas sempre – acredito, após sucessivas leituras – incompletas e subjectivas. Quero isso sim, com este texto, realçar o papel da dança enquanto instrumento de transcrição estética do pensamento de uma época e das suas dinâmicas histórico-culturais, na linha de Pavel Florenskij2. Se outras formas de arte são consideradas naturalmente uma representação cultural, a dança ainda está a tentar defender este seu valor, sendo muitas vezes considerada apenas um fenómeno de diversão e precisando, ainda, de alcançar um alto nível de intelectualidade para conseguir o reconhecimento artístico. Com este estudo defende-se o papel da dança enquanto forma artística equivalente a qualquer outra e pretende-se, deliberadamente, chamar a atenção tanto para o efeito estético como também sensorial e cognitivo que representam a essência desta arte. Na dança, a representação é vista como um desenho dinâmico contínuo que chega a modificar o seu meio – o espaço – e o seu agente – o corpo – na própria perceptibilidade e, portanto, a percepção da forma estética resultante deste processo constitui apenas um dos elementos salientes, não o principal. Como irá ser referido nos capítulos seguintes, a dança transporta consigo um carácter social e/ou cerimonial que é repetido e, portanto, constantemente reafirmado, que tem razão de ser somente em condições específicas. A dança modifica-se quando as questões de origem mudam e se transformam reagindo a um contexto social diferente. O conjunto de gestos, ritmos e dinâmicas entre indivíduo e grupo que a caracterizam são a transcrição artística de uma vivência e percepção do mundo, ligada apenas de forma efémera à beleza plástica do gesto mas vinculada à sua funcionalidade simbólica. A funcionalidade do gesto é um ente migrante: ela vai-se encarnando em elementos simbólicos diferentes, que caracterizam e definem contextos específicos; este é o princípio com que ela se transfere de um lugar a outro, passando por diferentes estéticas, mas carregando sentidos originários. Eu chamo a este processo “refuncionalização”. Contudo, esta representação de um mundo social sintetizada nas danças não deixa de ser uma rede de relações entre elementos vivos que muda consoante a alteração do equilíbrio entre os seus agentes, sendo ela, na sua vertente espontânea, uma dinâmica de interacção social como outras, apenas diferente pela sua função narrativa e auto-reguladora de um microssistema de trocas.
Assim, a dança pode ser não apenas sujeito de estudo das ciências sociais mas também instrumento no estudo da sociedade, bem como objecto estético de representação que a própria sociedade elege para se definir. No caso deste volume, quis mostrar que a história da evolução da dança teatral em Cuba funciona como um espelho das mudanças sociopolíticas do país, tal como sucede numa galeria, ao observar uma colecção de pinturas de uma determinada época histórica. Neste sentido, podemos ainda afirmar que a dança apresenta, à semelhança das outras artes, um valor epistemológico: criando estruturas e modalidades de troca que revelam equilíbrios psicossociais. A teoria do conhecimento revela-nos, através de esquemas, modelos e símbolos, a distância estabelecida entre as coisas e os sujeitos, uma perspectiva de acção e reacção concebida em consequência de uma dada compreensão do mundo.
A dança utiliza os mesmos instrumentos com uma finalidade representativa, operando com uma linguagem simbólica constantemente regenerada e renegociada, para expressar a descoberta, eternamente imanente, do ser humano perante o contexto. Ela corresponde, então, à descrição da teoria do conhecimento formulada por Pavel Florenskij:
Nos seus níveis inferiores ela cria esquemas e modelos, nos níveis superiores cria símbolos. A questão da linguagem simbólica é uma das questões fundamentais da teoria do conhecimento.3
Notas:
1 Para o uso do termo vocabulário de dança, remete-se para o capítulo 3, nota 13.
2 Cf. Pavel Florenskij, Lo spazio e il tempo nell’arte (Milão: Adelphi, 1995).
3 Cf. P. Florenskij, Il Simbolo e la Forma (Turim: Bollati Boringhieri 2007), 6 (tradução minha). Todas as traduções das citações presentes no texto são de minha autoria.
AGRADECIMENTOS
Por terem tornado possível o impossível e terem insistido na importância da imersão total neste contexto, devo um eterno agradecimento aos meus professores em Cuba: Graciela Chao Carbonero, Barbara Balbuena, Domingo Pau, Daisy Villalejo, Lourdes Tamayo, Jenniselt Galata Calvo, Yohana Dusatz Rodríguez, Juan Carlos Esquijarrosa Mederos, Carlos Armignan, Enrique Armignan. À Madeline Rodriguez, que me introduziu pela primeira vez nas cerimónias afro-cubanas, o meu eterno obrigada. Quero também agradecer aos professores que, na Europa, me ajudaram a orientar o meu interesse e a minha pesquisa. Entre os muitos que admiro e agradeço, menciono aqui Sergio Larrinaga, Daniela Giacone, Luanda Pau Baquero e Suleymi Barrera que sempre me motivaram neste caminho. Na verdade, foram muitas as pessoas que me ajudaram das mais diversas formas neste complexo percurso, nas aulas, procurando comigo músicas, livros, vídeos, partilhando tudo o que tinham e até abrindo-me a porta de casa em situações fortemente problemáticas, como pode ser a chegada de um furacão a uma ilha tropical. Agradeço a Ramiro Guerra os importantes momentos de partilha, a Rogelio Martinez Furé as sábias palavras e os conselhos, à Maria Borroto a paciência para discutir as minhas ideias nas horas mais improváveis e costurar para mim até de madrugada, a Fidel Pajares a confiança e a ajuda, ao meu padrinho em Cuba Alfonso Perez Borrero e ao babalawo e amigo Yonel Castilla Serrano o acompanhamento espiritual neste percurso. Não posso deixar de agradecer ao Centro de Estudos Comparatistas da Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa, a minha primeira instituição de acolhimento em Portugal, que acreditou neste estudo integrando-o no seu plano de actividades.
I
INTRODUÇÃO HISTÓRICA: A ÉPOCA COLONIAL
As imagens artísticas são fórmulas de compreensão da vida, analogamente às da ciência e da filosofia. Tanto umas como outras são as mãos de um único corpo e é possível, em qualquer momento, indicar uma determinada fórmula da arte associando- -a à sua fórmula gémea do pensamento abstrato: entre uma e a outra não existe igualdade mas, sim, correspondência. Pavel Florenskij No seu livro Tras las huellas de las civilizaciones negras en America, Argeliers León afirma que no Novo Continente os africanos eram considerados, durante muito tempo, apenas pela sua função no equilíbrio económico e que foi apenas numa base afectiva que africanos e afro-descendentes conseguiram criar um espírito de comunidade e interajuda durante o período colonial, sem conseguirem alcançar, ainda, uma verdadeira consciência de si tanto como elemento cultural autónomo quanto como motor económico. Com a mesma perspectiva, Frantz Fanon esclarece que:
O persistir da fidelidade às tradições originárias é visto como uma resistência ao colonizador, uma resistência à sociedade colonial e uma adesão à sociedade nacional. A cristalização e repetição do ritual integra o indivíduo na tradição, e também afirma a perenidade do próprio mundo de pertinência. Foi com a gradual emancipação do negro, e a criação de escravos livres, ou servidores domésticos, que se criaram bairros negros fora das cidades ou no campo, e ali, em zonas separadas, as tradições reviveram e afloraram os fragmentos culturais que ainda emanavam das tradições africanas.4
No caso do africano levado para as Américas, a escravidão não determinou apenas a perda do seu ambiente e das suas relações, pois também lhe foi retirada a relação funcional entre a própria identidade, o papel social e o próprio trabalho, o que o impossibilitou durante muito tempo de desenvolver qualquer sentimento de consciência de classe e incidiu na sua incapacidade de assimilação em grupos. Ele foi, como relembra Argeliers León, “incluído num processo de coisificação, transformando as suas relações em relações de objetos”5.
Ainda segundo Léon, “o aparato performativo ritual de raiz africana constituía um lugar seguro, um abrigo, uma protecção contra a alienação representada pela forçosa absorção pelo sistema colonial”6 . Da mesma opinião é Jean Paul Sartre, que salienta ainda o papel da profissão religiosa e do seu aparato performativo na preservação da identidade cultural, individual e comunitária nos contextos coloniais:
Sob os olhos divertidos do colonizador, protegiam-se contra eles próprios por meio de barreiras sobrenaturais, tanto reanimando antigos mitos terríveis, como agarrando-se a rituais meticulosos: é assim que o obcecado foge da sua profunda necessidade ao infligir-se manias que os afligem em cada momento. Eles dançam: isto ocupa-os; e solta-lhes os músculos dolorosamente contraídos, e, assim, a dança mima, em segredo, muitas vezes sem eles saber, o Não que eles não podem dizer, os homicídios que não ousariam cometer. Em algumas regiões, eles usam esse último recurso: a possessão. O que outrora era o facto religioso na sua simplicidade, uma certa comunicação do fiel com o sagrado, foi transformada numa arma contra o desespero e humilhação: os Zarés, os Loas, o Santos da Santería baixam e penetram neles, governando a sua violência e usando-a em transes até a exaustão. Ao mesmo tempo, estas altas personagens protegem-nos: isso significa que os colonizados defendem-se da alienação colonial aumentando a alienação religiosa. Com o único resultado, no final, de acumular as duas alienações, e que cada uma delas reforce a outra. [...] Acrescentem, para uns poucos infelizes rigorosamente selecionados, a outra possessão de que falei mais acima: a cultura ocidental.7
A prática da dança também entrava nesta dinâmica, mesmo tendo-se inserido gradualmente num processo de secularização e tornado-se cada vez mais uma “expressão cinética de necessidades individuais”8 . Assumindo as afirmações de Léon, é inegável que a unidade cultural que supostamente os africanos deviam, na altura, afirmar e defender e que os tornaria uma unidade cultural, no início do período colonial não existia. Os processos de sincretismo e transculturação que deram origem à cultura afro- -descendente na diáspora ainda estavam a decorrer, através de um difícil processo de negociação entre várias culturas que no continente africano eram inimigas entre si por questões territoriais e religiosas, apesar de terem elementos salientes que o colonizador interpretava como similares. Uma forma de crioulização entre afro-descendentes teve que começar a surgir para que as diferentes representações de África começassem a entrar em diálogo e a ser perceptíveis como iguais manifestações de um único fenómeno. Até aí, os vários grupos étnicos tentaram manter as próprias religiões e as próprias manifestações culturais de forma escondida, sendo estas formalmente proibidas, não apenas em Cuba mas em todas as colónias. Hoje em dia, as dificuldades de leitura dos diferentes fenómenos performativos ainda dependem da impossibilidade de perceber até que ponto alguns destes são produtos de um específico grupo étnico ou da crioulização de formas culturais similares entre si. Podemos já antecipar que a maioria do repertório folclórico de descendência africana presente hoje em Cuba, e na América latina em geral, é fruto de uma crioulização interna, e, apesar disso, é ainda historicamente interessante tentar perceber de que específico traço cultural provêem os carácteres salientes de cada um. A representação das próprias raízes culturais africanas é, para os afro-descendentes presentes no continente americano, um processo de dolorosa conquista, não é algo que acontece de forma espontânea ou automática. Durante o período colonial, nas suas várias fases, o escravo e os seus descendentes conseguiram adquirir um sentido de grupo em que a reprodução das tradições constituía uma forma de reapropriação de uma história própria, que possibilitava a inserção do sujeito num grupo onde ele poderia ter um papel de desenvolvimento social e uma participação activa. As performances rituais constituíam elementos de regulamentação do grupo social e, também por isso, os colonos queriam evitar manifestações deste género, que davam força ao agregado social e que podiam constituir terreno fértil para a formação de insurreições internas. A Igreja Católica acrescentava a esta desconfiança uma absoluta demonização das cerimónias rituais que, portanto, continuaram na sombra durante muito tempo, para encontrar, por fim, uma manifestação no culto sincrético da Santeria, onde se escondiam por detrás da representação dos santos católicos, formas de cultos africanas. Isto aconteceu com diferentes grupos religiosos de origem africana, mas determinou também a criação de um diálogo interno entre os diferentes grupos étnicos que, para a própria sobrevivência dos cultos, e segurança perante a ameaça dos colonos, tiveram que se associar tanto quanto possível criando manifestações comuns. Este fenómeno foi-se reproduzindo de forma análoga em vários territórios da América Latina, onde se criam diferentes crenças religiosas de matriz africana representativas da presença dos diferentes grupos étnicos e do poder dos seus diferentes membros nestes territórios.
Foi, então, lógico que o nascimento de uma primeira consciência de classe negra acontecesse inicialmente nas áreas mais pobres das cidades, ou do interior da ilha: onde a alienação social criou a necessidade de uma consciência alternativa, que reforçou a procura do irracional, como condição privilegiada de contacto com o mundo exterior. Convém não esquecer que a ligação com este mundo tradicional foi sempre forçada para os afro-descendentes: sendo o mundo colonial onde viviam já rico em mestiçagem, contaminações e elementos provenientes de fontes diversificadas, e a própria condição do negro de nação (assim eram definidos os escravos originários de diferentes nações africanas) e a do negro crioulo, absolutamente diferentes e por isso geradoras de conflitos internos. Isto tinha interferência em tudo, também nos valores que o homem ia formando e no processo de transculturação que se criava na constante exigência de adaptação. Em Cuba, o ponto de partida para a criação de uma identidade cultural de raiz africana foi a gradual diferenciação de interesses entre as principais componentes da sociedade. A partir do momento em que, face à revolução socialista, os interesses opostos se uniformizaram, os diferentes grupos culturais puderam identificar-se na necessidade de participar no processo de construção de uma identidade comum. O necessário processo de consciencialização cultural e identitária teve inicialmente um difícil e delicado equilíbrio e, hoje, temos de considerar a complexidade destes factores ao estudar a sociedade cubana antes e depois da época revolucionária. Temos, de facto, de saber avaliar em que nível de transculturação9 se encontrava a sociedade antes das reformas culturais que privilegiaram a cultura de raiz africana, e em que nível esta foi colocada no momento da revolução, para perceber se, e de que forma, esta foi “revelada” a si própria ou, pelo contrário, se foi apenas transformada pela política cultural da época numa cópia conforme ao seu passado mítico. Não sabemos se a representação teatral das danças folclóricas estava, desde o início, entre os propósitos da Reforma Cultural Revolucionária do ensino das artes e, portanto, na perspectiva genérica de um investimento global e substancial na formação artística, ou se a intenção primária do projecto cultural se limitava apenas à preservação e divulgação da cultura negra e popular para combater a tendência discriminatória no país. De qualquer forma, esta etapa acabou por criar uma enorme adesão às artes entre a população, reforçando uma raiz cultural que se estruturava em várias vertentes: literária, artística e também religiosa. Estes elementos, apesar de terem sido considerados separadamente e, terem sido, aliás, propositadamente desvinculados um dos outros pela política cultural vigente no país, relevaram-se incindíveis e caminham hoje na direcção de uma reunificação. Não podemos ainda cair na ingenuidade de ignorar que uma parte fundamental das estratégias políticas dos regimes despóticos se baseia na construção de uma ideologia nacional unitária, que opera por meio da recriação de um passado mítico e um sistema simbólico forte, e com ligação aos estratos sociais inferiores. De facto, o complexo panteão Yoruba, bem como os das etnias Ewe-Fon e Bantu ofereciam uma simbologia rica e uma literatura nobilitante pelas raízes africanas do país, que se tinham ainda sincretizado entre elas bem como com o culto católico. Esta cultura trazia consigo um elemento que ia na direcção oposta à orientação anti-religiosa tomada pelo governo revolucionário, sendo ela não uma mera reminiscência do passado mítico mas um sistema religioso vivo e socialmente activo. Assim sendo, num país que estava a tornar-se progressivamente laico, a cultura afro-cubana começou gradualmente a ser representada no meio artístico, sem deixar de revelar a força das suas manifestações de culto sincrético que, apesar de terem sido silenciadas durante muitos anos, acabaram por ganhar força e por se tornar hoje mais presentes e vivas mesmo fora de Cuba. A política cultural antes e depois da revolução Cuba foi uma colónia de escravos espanhola até ao final do século XXI, tendo sido o penúltimo espaço na América a abolir a escravatura.10
Os lugares onde os africanos podiam encontrar-se no início da época colonial não eram muitos, apenas as casas dos proprietários em épocas de festa e também, mais tarde, as casas dos escravos livres, que apesar de ser controladas e sujeitas a severas restrições, conseguiram proporcionar durante algum tempo festas e cerimónias onde se celebravam os cultos e se tocavam ritmos dos diferentes grupos étnicos. Com o tempo, algumas destas casas chegaram a transformar- -se em casas religiosas, sendo o culto algo que não podia ser exposto publicamente em templos ou locais reconhecíveis. Os diferentes grupos diferenciavam-se nos próprios cultos e simbologias, e isto conferia diversidade a cada aglomerado urbano, tendo estes, representação diferente nas várias áreas urbanas conforme o momento de chegada na ilha e o tipo de trabalho de destino, determinado pelas diferentes exigências das produções de açúcar, tabaco, e, mais tarde, de café11 .
A mais antiga exposição pública da cultura africana coincidiu curiosamente com uma importante celebração católica, o Corpus Christi, tendo os negros tido, nesta circunstância, autorização para sair em procissão com as suas danças e cantos. Esta prática foi bastante difundida em todo o território colonial de matriz católica, tendo sido uma estratégia da igreja, já na época medieval, a de criar situações de – aparente – integração cultural, baseadas na celebração de festas católicas: onde a desculpa da festa religiosa se tornava uma oportunidade para introduzir os povos locais em fase de evangelização aos rituais católicos, tendo estes, em contrapartida, autorização para representar as suas próprias manifestações culturais. Desde Cuba até ao Chile, Uruguai, Brasil, Angola e até Goa, temos descrições destas procissões cheias de cores, cantos e símbolos que, inicialmente, eram características do Dia dos Reis, ou do Corpus Christi, mas que começaram a repetir-se para homenagear os patronos das cidades e aldeias. Em Cuba, como no Brasil, os escravos saiam à rua para representar os diferentes Cabildos de Nação12, ou Bandos de Nação: estes eram entidades associativas onde os escravos tinham uma estrutura organizativa e uma limitada liberdade de expressar as próprias culturas e cultos. O nome Cabildo designa um órgão administrativo próprio do governo espanhol, responsável pela governança de todas as áreas habitadas tanto na pátria mãe como nas colónias, onde se tornou um instrumento de extrema importância para o controlo sociopolítico local.
A criação de cabildos de nação derivou da ideia de estender estes órgãos a zonas das cidades ou das periferias onde se encontrava um número já amplo de escravos livres: divididos sumariamente por nações de origem estes encontravam nestas instituições a possibilidade de construir um lugar de encontro e partilha necessário para a preservação das próprias culturas, mas ao mesmo tempo ofereciam ao governo local uma maneira para os controlar. Estas unidades administrativas revelaram-se profundamente importantes para a preservação das culturas africanas na diáspora, que representavam publicamente durante as manifestações religiosas católicas desfilando com as suas Congas13: nestas procissões desfilavam o Rei e a Rainha do cabildo, acompanhados por uma corte com várias figuras específicas, estes desfiles incluíam músicas, cantos e danças próprias. Por esta razão, e por se tornar o lugar primário de transculturação onde a hegemonia do catolicismo não conseguia penetrar, a existência dos cabildos gerava opiniões muito controversas14. O historiador Ernesto Buch López descreveu uma cena relativa às celebrações do Dia dos Reis em Santiago de Cuba:
O Rei Congo passou com solene austeridade seguido do seu corpo de guarda, vestido de forma impecável. Perto dele a conga entretém-se na sua algazarra. Numa outra rua com a mesma cerimónia passa o Rei Lucumi, nunca se encontram. Respeitam-se. O breve reinado vai durar três tardes seguidas. Três tardes de honras entusiastas. Depois o rei voltará a ser escravo do seu dono ou ao seu quartinho a trabalhar, se já for livre.15
Na própria festa do Corpus Christi, como em outras festividades Cristãs, está provavelmente a origem do teatro, não apenas em Cuba mas em toda a região caribenha. Até ao século XVIII, Cuba caracterizava-se por uma condição de atraso e pobreza material, analfabetismo e falta de comunicação entre as várias aldeias. Depois do esgotamento das minas de ouro, em 1541, para o reino de Espanha, a ilha passou a desempenhar um papel essencialmente estratégico e militar, sendo a produção interna apenas suficiente para o consumo local. Havana era escassamente desenvolvida a nível urbanístico e a nível de instituições públicas. A diversão também era quase inexistente, não havendo sequer lugares apropriados para isso: devido à ausência de teatros, os poucos espectáculos tinham lugar nas igrejas – principalmente farsas, comédias e intermezzos – o que originava frequentes protestos das autoridades eclesiásticas, que acabaram por as proibir, proibindo também os clérigos de participar nelas, sendo que estas não tinham nenhuma ligação à fé católica. Tendo que dar ao povo algum espaço de diversão, as manifestações foram organizadas fora das igrejas mas inseridas em contextos celebrativos religiosos, como na festa do Corpus Christi. Os textos apresentados tinham que ser previamente controlados e revistos e as manifestações performativas eram censuradas, todavia esta colocação ajudou o desenvolvimento destas celebrações como eventos cada vez mais complexos e completos a nível artístico.16 O primeiro registo da festa do Corpus Christi na América Latina remete ao ano de 1520 e à cidade de Santiago de Cuba. Esta cristalizou-se como uma festa não exclusivamente religiosa, caracterizada pelo desfile de carros, em cima dos quais se representavam Autos Sacamentales, ao qual se seguiam momentos musicais, de dança e bailes. Algumas figuras já características em Espanha, como os “gigantones” ou a “Tarrasca” estavam presentes também nas colónias. A atitude da igreja perante estas manifestações foi mudando ao longo do tempo, passando de um proceder indulgente no século XVI, até uma rígida regulamentação no século XVIII. Em 1605 começaram a ser censurados os adornos e o uso de bois, burros e cavalos para os carros, devido ao barulho causado. Em menos de um século chegou-se a proibir qualquer tipo de comédia profana para a festa do Santíssimo e em 1680 foi proibida a dança para todas as mulheres na festa do Corpus Christi, permitindo-se apenas as exibições de homens que fossem considerados “honestos” e com indumentária decente. De facto, estas circunstâncias constituíram os primeiros exemplos tanto de teatro como de miscigenação cultural no contexto social da ilha: aqui, as danças das cortes por um lado, e dos africanos pelo outro, tornavam-se visíveis e ocupavam por um breve período de tempo um espaço comum. Durante o século XVII seguiram muitas censuras, tendo o governo colonial cada vez mais receio perante as manifestações dos negros. A censura iniciou, já em 1681, por esta declaração do Sinodo na cidade de Santiago de Cuba:
Tendo sido proibidas as danças torpes e desonestas por muitos bispos e magistrados eclesiásticos em sede vacante, por causa dos danos que a estas seguem, pecados e escândalos para a república cristã, é justo e razoável que este santo sínodo as proíba; portanto mandamos sob pena de maior excomunhão maior latae sententiae, e de confisca dos instrumentos, que nenhuma pessoa que qualquer condição e qualidade faça, nem de dia nem de noite, bailes similares em sua casa, nem em nenhuma outra, nem consinta que nas próprias se façam, nem nos engenhos, permanências, corrales17, nem nos campos do nosso inteiro bispado, e ainda menos nas igrejas ou ermidas onde se celebrem festas ou velórios, sob nenhum pretexto e com nenhuma cor.18
Este processo culminou em 1799 com a publicação do Bando del Buen Gobierno, efectivo em toda a ilha, que estabelecia multas para todos os negros apanhados em acto de dança ou canto em cabildos ou casas particulares; estas multas consistiam em 25 chicotadas para os escravos e multas em dinheiro para os negros livres. Tal atitude, todavia, exacerbou a existência destas práticas que, de forma oculta, foram negociando e cristalizando as representações culturais de raiz africana no território cubano.19 Um grande impulso ao surgimento da actividade geralmente definível como teatral na ilha foi a injecção cultural que se deu com a chegada das comunidades provenientes da ilha do Haiti, após a revolução de 1796, que teve uma profunda influência não apenas na zona oriental (onde estas comunidades primeiro se instalaram) mas em toda a ilha. Foram no total acerca de 500 000 pessoas, entre franceses residentes no Haiti e escravos de origem africana; a maioria estabeleceu-se perto das cidades de Santiago e Guantanamo, por um lado por uma questão de proximidade geográfica com a ilha de origem, mas por outro lado por uma deliberada escolha governativa, que decidiu utilizar estes trabalhadores especializados, e mais avançados culturalmente, para impulsionar o desenvolvimento da região oriental da ilha. O progresso económico não tardou a chegar, e com ele uma série de inovações do âmbito artístico, entre as quais a criação do primeiro teatro de Santiago de Cuba e uma companhia de Ópera Cómica que propunha representações de autores clássicos franceses. Obviamente, as representações eram também motivo de festa, com participação de músicos, actividades de dança e partilha de comida. Os franceses residentes no Haiti tinham uma condição cultural mais avançada e queriam manter, mesmo nas colónias, a vivacidade intelectual e cultural existente em França, por isso procuravam recriar situações de partilha e diversão que, todavia, se caracterizavam pela elegância e pela postura controlada. Pela primeira vez, foi registada uma geral aprovação pelas maneiras educadas desta parte da sociedade que ia conquistando um espaço intermédio entre o da burguesia espanhola e dos ex-escravos e escravos africanos. Através desta comunidade, surgiu também uma defesa pública da dança como actividade nobre que favorecia a saúde das pessoas e que constituía uma forma de educação para vida da sociedade. A guerra napoleónica entre Espanha e França exacerbou este processo, tendo a França expulso os emigrados, muitos destes, que se tinham estabelecido em outras zonas, decidiram regressar a Cuba para se tornarem súbditos da coroa espanhola. Muitos deles, já com experiência na produção intensiva de café, assentaram nas terras da Sierra Maestra, convertendo em pouco tempo a ilha no principal exportador de café do mundo durante várias décadas. Em torno deste novo mercado criou-se um ambiente sociocultural muito específico, onde entre escravos e proprietários registava-se uma proximidade maior, devido à distância entre as fazendas e os núcleos urbanos e à maior familiaridade entre os membros que caracterizava a indústria do café em comparação com as outras.
Os franceses emigrados trouxeram também para ilha o exemplo de numerosos casos de concubinato entre homens brancos e mulheres mestiças que, de início, alarmaram fortemente as altas representações do poder religioso e governativo, constituindo durante muito tempo a única quebra na forte divisão social entre brancos e negros existente no território. As grandes casas dos proprietários, com necessidade de diversão e cultura, tornaram-se pequenos centros onde começaram a surgir formas contaminadas de arte, dança e música. Entre as várias práticas privilegiavam-se os bailes de sala: entre os quais a Contradança, o Minuete, o Rigodão e outros bailes cortesãos, juntando-se a estes a Tumba Francesa e outras formas de carácter crioulo. As danças mais nobres neste contexto passavam a ser praticadas para qualquer membro da sociedade e a ser depois reproduzidas e revisitadas nos locais de trabalho dos escravos, onde se criavam formas de transculturação entre a tradição das cortes europeias e as cortes africanas dos escravos, com os próprios símbolos. Lemos na obra Via Crucis, de Emilio Bacardi:
A sala de trilhar café tinha sido convertida em sala de baile. Tinham sido desmontadas as mesas de costura e também tinham sido apoiados às paredes os bancos das mulheres. Numa espécie de palco alto encontravam-se o rei e a rainha, a corte elegida pelos escravos; um pouco mais abaixo estava o bastonero – director de dança –, com eles estavam homens e mulheres com diferentes títulos hierárquicos. […] num círculo estavam os músicos com as suas tumbas e chachás, a maioria das negras tinha maracas de folhas de lata, marcando com estas o compasso da música e do canto.20
Segundo a opinião de Fernando Ortiz, estas reuniões não tinham um carácter religioso mas seguiam um cerimonial próprio que reflectia a própria riqueza folclórica: a orquestra era composta por dois tambores de couro e um catá21, específico para a dança Fronté, também dançavam-se os bailes Cocoyé, Masón, Jubá e Grasimá.
Os instrumentos e os ritmos vinham dos ritos misteriosos do Daomé e do Congo, as figuras e cadenas vinha de Versailles, mas os passos e as trocas relembravam ainda a plantação onde se fundiam os sangues, as cores, e se juntavam na mesma riqueza o açúcar branco e o café preto.22
A dinâmica do baile na obra é descrita como uma elegante Contradança, mas reflecte também as influências dos movimentos africanos:
Inclinando-se de vez em quando e passando por baixo do braço dela como por baixo de um galante arco triunfal, os bailarinos obtêm uma ovação dos que os observam. Os percursos repetem-se num movimento cadencioso e incitador das cadeiras e o delírio chega ao colmo: as maracas agitam-se como enlouquecidas ou possuídas de fúria; aumenta o repicar das tumbas […].23
Seguindo o sucesso do primeiro, um outro teatro foi fundado em Santiago de Cuba em 1823. Ao lado das representações teatrais, as danças começaram a sobressair e fazer parte integrante tanto dos espectáculos cénicos como da educação das elites: temos notícias de escolas inglesas e francesas que por volta da metade do século XIX tinham introduzido a dança nas disciplinas escolares.24
A presença dos novos teatros estimulou a curiosidade para novos géneros e em poucas décadas o gosto da população evoluiu; as manifestações de rua de base católica deixaram de despertar grande interesse, não satisfazendo o gosto mais sofisticado da população burguesa. Durante o século XIX em consequência do crescimento económico, também a oferta cultural começou a crescer e, em geral, floresceram os géneros de tradição espanhola, com particular evidência para a Zarzuela e a ópera, que se preferiam ao teatro dramático. As primeiras representações teatrais em Cuba foram claramente de gosto espanhol, e tinham de preferência o formato de peças de carácter patriótico ou peças clássicas da tradição espanhola que se iam alternando com danças trazidas de Espanha e, mais tarde, da Europa. O século XIX, de facto, foi caracterizado pela introdução em Cuba, e o sucesso, da ópera italiana e francesa e também pela difusão de partituras de compositores de renome internacional; ao mesmo tempo, todavia, começavam a aparecer nas orquestras instrumentos de raiz crioula como a marimba, as maracas e os chocalhos. O género mais presente era a Zarzuela, mas foi assinalado pelos cronistas da época o sucesso da Contradança, do Minuete, dos bailes ingleses e do Pas de deux que se iam alternando com Seguidilhas, Minuetes com influências do Fandango, vários sapateados de derivação espanhola, Lanceiros, Tajonas, Polcas e Rigodões. Com os anos 40 do século XIX começou a grande época dos balés românticos e o sucesso da moda francesa; esta época foi a que marcou a influência na ilha de duas grandes escolas europeias, que contribuíram definitivamente para a formação do gosto dos cubanos pela dança como fenómeno artístico: a escola de dança da Ópera de Paris, e a Academia austro-húngaro-alemã. A primeira trouxe especificamente o carácter depurado da dança em pontas e a visão etérea da bailarina romântica; a segunda trouxe a força coreográfica de peças que incluíam ritmos do folclore centro-europeu; e ambas trouxeram uma ideia de composição artística onde os ideais românticos se uniam a um carácter edificante da arte, cuja mensagem devia ser positiva para a sociedade, e representar valores patrióticos ou morais. Havana teve o seu primeiro espectáculo de balé em 1839 e, a partir desta data, os eventos deste tipo multiplicaram-se e espalharam-se pela ilha. A fusão de géneros apresentada neste tipo de óperas garantia a diversão do público e a vertente educativa, sendo, muitas vezes, as peças baseadas em lendas e contos mitológicos, e sendo estas partes alternadas com momentos de pantomima, exercícios plásticos e coreográficos que incluíam funâmbulos e ginastas,25 e danças folclóricas de gosto exótico como a Dança Escocesa, a Dança tradicional Irlandesa, a Tarantela e a Gitana, acompanhada por castanholas.
Foi este o momento de maior crescimento cultural e educativo da sociedade cubana colonial: foi o momento em que mais se divulgaram os símbolos da cultura de matriz europeia, que introduziram no país representações da mitologia clássica, mas em que também se consagrou a supremacia da cultura católica e a sua finalidade educativa, que utilizava a sátira e a criação de personagens cómicas para condenar os vícios da sociedade. Foi uma época fortemente caracterizada pela censura, já não exercida exclusivamente pela igreja – preocupada desde sempre com o crescimento da moral anticatólica –, mas agora principalmente gerida pela administração pública – preocupada com o crescimento das posições independentistas, que desde os meados do século XIX se tinham começado a difundir entre os países da América Latina. Neste contexto nasceu a primeira forma de Cubanía, com a representação dos primeiros géneros artísticos locais, muitas vezes de origem camponesa, que representavam obras escritas por cubanos de diferente origem que defendiam uma identidade específica que não se reconhecia com a identidade espanhola. A este respeito, as celebrações de carnaval, introduzidas no Dia dos Reis, com o passar do tempo constituíram o espelho desta evolução e contaminação de géneros, onde as formas cubanas modernas coexistiam com as introduções musicais de origem negra.
A festa do Dia dos Reis celebrava-se todos os anos em todas as cidades cubanas e via a participação tanto de escravos como de negros livres, divididos nas distintas nações africanas com os seus “deuses” representados: participavam afro-descendentes de todas as idades, bem como burgueses brancos mascarados, maquilhados ou caracterizados de acordo com a personagem representada. Estes, de acordo com as muitas descrições existentes, desfilavam pelas ruas numa procissão que, de forma análoga à do Corpus Christi, partia dos cabildos até chegar à praça principal e ao palácio do governador; caminhavam acompanhados pela música de tambores numa sequência de canções e refrãos, com intermezzos de danças peculiares. Aqui, sobressaíam os valores afro-cubanos que se iam cruzando e sobrepondo com os valores religiosos cristãos.
Os negros livres caracterizavam-se pela imitação exagerada dos costumes dos proprietários, com os chapéus, as insígnias e todos os símbolos do poder, como bandeiras, estandartes, ceptros e bastões, transportando imagens católicas que eles adoptavam como cobertura para a celebração dos seus símbolos religiosos. Lê-se nas observações de Walter Goodman:
É tempo de carnaval e eles – os mamarrachos – membros da servitude da mansão têm autorização de permitir-se familiaridades com os proprietários. Entre todos trazem uma grande tela pintada. Sem hesitar, fixam-no no meio da sala e improvisam um cenário. As representações são abertas por uma estranha orquestra composta por tambores, panelas, colheres de lata e reco-recos. A seguir os actores entram em acção. Cada um faz o que pode […].26
A festa constituía, desta forma, um propósito de igualdade social e de reafirmação dos próprios cultos, os participantes cantavam nas línguas de origem ou num espanhol mestiço, “bozal”. Nas cenas mais teatrais que iam representando, podiam-se reconhecer as formas do teatro espanhol que eles reproduziam, preenchidas pelos seus próprios elementos culturais,27 sobretudo nos carros e figurinos de representação das diferentes comparsas. O Carnaval foi registado oficialmente como evento em Havana pela primeira vez no dia 6 de Janeiro de 1842, 28 mas como vimos, esta forma de celebração manifestou-se em formas diferentes e descontínuas desde o início do período colonial em associação às várias celebrações religiosas de derivação das Carnestolendas de tradição espanhola, portanto, a concentração do evento carnavalesco na data do Dia dos Reis não constitui o início de uma nova festividade religiosa mas a culminação de um processo começado no século XVI.
A música que reinava (e ainda reina) nos Carnavais é a Conga que, com algumas mínimas diferenças rítmicas e instrumentais, se encontra presente em todo o país. A Conga produz-se na rua criando uma espécie de balé ambulante e consiste numa música ensurdecedora produzida por um grupo de tambores, chocalhos, ferros e canto.29 Este tipo de manifestação, embora fosse cada vez mais rica e amada pela população, ia-se diferenciando cada vez mais das manifestações de carnaval que iam acontecendo nas festas dos salões nobres, onde os estilos mais burgueses se iam sincretizando de outras formas.
Com a proclamação da independência de São Domingo, em 1822 caiu o primeiro baluarte do poder espanhol na América latina, e a situação política em Cuba começou a tornar-se cada vez mais quente. As sucessivas sublevações ocorridas no final do século XIX tiveram, como uma das suas causas, as polémicas entre escravidão e abolicionismo. Nesta altura, Cuba era, como Porto Rico, uma das últimas colónias espanholas na América e em ambas as ilhas a escravidão tinha um peso económico de relevo.
Após a Revolução de 1868 contra o regime monárquico de Isabel II, o activismo abolicionista impulsionou a Lei Moret, que concedia a liberdade a qualquer indivíduo nascido posteriormente a 17 de Dezembro de 1868, bem como aos escravos com mais de 60 anos. Em 1873 foi proclamada a abolição da escravidão em Porto Rico mas ainda não em Cuba, onde o número de escravos era largamente maior. Aqui, a suspensão da escravidão foi proclamada apenas em 1879, e isto determinou não apenas a retribuição do trabalho para os ex-escravos, mas também o direito destes últimos ao ensino primário e a uma educação profissional, à alimentação e a uma assistência médica para crianças e adolescentes. A partir deste momento tornava-se oficial a tentativa de estimular a promoção social e solicitar a identificação dos ex-escravos como cidadãos do novo estado.
A 7 de Outubro de 1886, a escravidão desapareceu legalmente, mas a integração dos escravos ainda não tinha sido completamente resolvida: o descontentamento popular continuava vigente e as condições dos negros e mulatos na colónia eram miseráveis. A falta de meios e de organização interna impediam a criação de um movimento independentista eficaz, o que arrastou a situação até a Guerra de Independência Cubana de 1895-1898 que, de facto, qualquer a grande quantidade de “mão de obra” livre que procurava, de alguma maneira, ser reconhecida oficialmente no tecido social. Esta guerra, a última de uma série de guerras conduzidas para eliminar a ingerência de Espanha no território cubano, foi possível graças à capacidade de José Marti de vencer a própria elite cubana – desde sempre contrária à independência, receosa de uma revolução em Cuba análoga à que tinha acontecido no Haiti. Em 1868, Carlos Manuel Céspedes foi o primeiro a libertar os seus escravos para que estes participassem na guerra e em 1869 uma nova constituição marcou o primeiro passo na emancipação dos escravos, apesar da efectiva libertação acontecer apenas dez anos mais tarde.
A libertação da ilha obtida por José Marti, em 1898, não poderia ter sido alcançado sem o maciço suporte dos escravos.
Durante as guerras da independência projectou-se um discurso político que prometia a criação de uma nação para todos os cubanos e a possibilidade de democracia racial. O papel que os afro-descendentes desempenharam nestas lutas permitiu-lhes uma maior inclusão na cena pública, reconhecendo-lhes o sufrágio universal masculino (em 1902). No entanto, o racismo privado e quotidiano, continuou a permear as relações sociais, e as próprias zonas da cidade de Havana estavam nitidamente divididas em zonas brancas e negras. Na verdade, a independência da ilha foi obtida graças à intervenção dos Estados Unidos que, movidos por interesses económicos, em 1898 a ocuparam e declararam guerra a Espanha. Em consequência disto estes estabeleceram desde 1901 um protectorado, o que lhes dava o direito de intervir militarmente em qualquer momento em que os seus interesses comerciais estivessem ameaçados, e estabeleceram um governo provisório por eles dirigido que, obviamente, estendia ao novo território as políticas socioculturais fortemente discriminatórias que ali albergavam. Em 1912, à tentativa de criar um “Partido dos Independentes de Cor” o estado respondeu com uma acção armada que causou a morte de milhares de afro-cubanos.30 A autora Aline Helg afirma que a sociedade cubana continuou dividida por “raças” e que o mito da democracia racial foi apenas uma estratégia para acalmar as ambições das minorias e negar aos negros as reivindicações de igualdade racial.31 Como sublinha De la Fuente:
A ideia de democracia racial em Cuba, pelo menos no nível retórico, significou a inclusão de grupos raciais subordinados na ideia de nacionalidade e permitiu, para alguns, uma certa mobilidade social, mas não os livrou de um papel marginal. Pelo contrário, a ideia de igualdade e fraternidade racial promovida pelas políticas de alianças inter-raciais, assinadas durante a guerra contra a Espanha, garantiram a manutenção de um racismo radicado e dissimulado.32
Este modelo de alianças inter-raciais funcionou apenas como limitador do poder das elites: no sentido em que impossibilitou a instalação do sistema de segregação formal, na altura presente nos Estados Unidos, e que, com a crescente presença dos norte-americanos na ilha, podia ser facilmente implementado em Cuba33 .
Apesar da existência deste sistema, não só os negros mas também os mulatos eram ainda formalmente excluídos de qualquer carga oficial e sobretudo política. A existência deste processo formal de alianças, todavia, tendo manifestamente dificultado formas de mobilização social e política baseadas na identidade racial, acabou por permitir o nascimento das primeiras formas de associação multirracial, como por exemplo, os movimentos operários.
Nesta época de grande sensibilização da sociedade para temas de valor social e moral, na burguesia – culturalmente mais activa – cresceu o fascínio das peças dos Balés russos, onde o conceito da dança encontrava uma direcção comum com a composição musical e os temas culturais. A influência principal trazida pelos Balés russos, foi a de representar um repertório construído na base de um imaginário amplo, rico de elementos históricos, mitológicos e culturais, também de carácter exótico para o contexto cubano, apresentando todos na forma unificante de uma linguagem artística sublimada, alta e de matriz exclusivamente clássica: onde todas as influências eram incluídas a nível de conteúdo da mensagem narrativa mas a linguagem formal apresentava uma exactidão e uma excelência até aí desconhecidas. O impacto das grandes escolas de proveniência europeia foi tão forte que estimulou o nascimento da Associação Pro-Arte Musical, em 1918 em Havana: a instituição tinha o propósito de estimular e facilitar a difusão das belas artes em Cuba e desde 1930 começou a oferecer cursos de dança, guitarra e actuação para os associados, primeiramente em Havana e depois em filiais abertas em Cienfuegos, Camagüey e Santiago de Cuba. Esta instituição constituiu a primeira forma de democratização da educação artística em Cuba depois do período colonial e, apesar de ser um órgão ainda fortemente ligado à classe burguesa, disponibilizou a aprendizagem artística a categorias sociais, que normalmente não teriam acesso a esta aprendizagem. A sociedade escolheu professores de excelência para a abertura dos cursos e, entre eles, foram seleccionados alguns russos, como Nicolai Petrovich Yavorksky, que se tornou o primeiro professor de dança de Alicia Fernando e Alberto Alonso34.
4 Frantz Fanon, Peau noire masques blancs (Paris: Seuil, 1952), 219.
5 Argelier León, Tras las huellas de las civilizaciones negras en America (Cuba: Fundación Fernando Ortiz, 2001), 50.
6 Ibid.
7 Jean Paul Sartre, “prefácio”, in Frantz Fanon, Les Damnés de la Terre (Paris: Éditions Maspero, 1961), 22.
8 Ibid.
9 Segundo a definição dada por Fernando Ortiz em Contrapunteo cubano del tabaco y el azúcar (Havana: Editorial de Ciencias Sociales, [1940] 1983), 86-90.
10 Sobre a participação da população afro-cubana nas guerras pela independência de Cuba veja-se: Bruno José Rodrigues Durães e Iacy Maia Mata, “Cuba, os afro-cubanos e a revolução: passado e presente”, História Social 17 (2009): 143. Cf. Rebecca Scott, A Emancipação Escrava em Cuba: a transição para o trabalho livre, 1860-1899 (Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1991).
11 Fernando Ortiz, Contrapunteo Cubano del tabaco.
12 Na altura em que Espanha estabeleceu as próprias colónias de exploração na América foram criados alguns concelhos municipais para a administração das terras conquistadas, estas divisões administrativas assumiram o mesmo termo utilizado na própria Espanha para as administrações locais: Cabildos. Bethell Leslie, História da América Latina – vol. 1, América latina colonial. 2.ª ed. (São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, 1998).
13 Conga, ou Congado (sobretudo no Brasil), é o nome que designa um agrupamento de música, dança e canto, que é habitualmente ligada a um cabildo.
14 Ernesto Triguero Tamayo, Placeres del Cuerpo (Santiago de Cuba: Editorial Oriente, 2015), 21-29.
15 Ernesto Buch López, Del Santiago Colonial (Santiago de Cuba: Editorial Ros, 1944), 155. Há várias descrições similares relativas a procissões do Corpus Christi no Brasil, especialmente na Baía; entre as várias existentes no relato do francês François Frogeras, de 1696, as procissões dos Cabildos são descritas como: “bandos mascarados, músicos e bailarinos que com posturas lúbricas, perturbavam inteiramente a santa cerimonia”. 16 Ramiro Beatón, Marcial Lorenzo Escudeiro, Pascual Díaz Fernandez, Teatro en Santiago. Memoria y pasión (Santiago de Cuba: Editorial Oriente, 2015).
17 Com o termo Corral de comedias designava-se em Espanha uma forma de teatro instalado no pátio das casas plebeias. Estes foram os primeiros teatros permanentes existentes em Espanha depois dos teatros de época romana. Estas manifestações começaram a surgir no século XVI e estão ligadas ao desenvolvimento do teatro do Siglo de Oro espanhol.
18 Sinodos Americanos I, Sinodo de Santiago de Cuba de 1681, Colección Tierra nueva e cielo nuevo (Madrid-Salamanca: Instituto Francisco Suárez, C.S.I.C. e Instituto de História de la Teología, 1982), 13-14, cit. in Ernesto Triguero Tamayo, Placeres del Cuerpo. La Danza en Santiago de Cuba, 33.
19 Zoila Lapique Becali, Cuba colonial. Música, compositores e intérpretes 1570-1902 (Havana: Editorial Boloña e Editorial Letras Cubanas, 2008), 70-71.
20 Emilio Bacardi, Via crucis (Cuidad de La Habana: Editorial Letras Cubanas, 1979), 53- -54.
21 Por catá podem-se definir dois tipos de tambor: ou cilíndrico contruído à base de um tronco de árvore, ou uma lata de metal – aberto ou fechado por baixo – ou construído com placas de madeira em forma de paralelepípedo, ou trapézio, normalmente fechado, mas com vários orifícios em um dos seus lados.
22 Fernando Ortiz, Del folklor antillano afrofrancés, in Del Caribe 8 (IV, 1987): 63, cit in. Ernesto Triguero Tamayo, Placeres del Cuerpo, 46.
23 Emilio Bacardi, Via crucis, Ibid.
24 Cf. Ernesto Tamayo, Placeres del Cuerpo, 48-49.
25 Por este tipo de práticas cénicas ficou conhecida sobretudo a companhia Ravel, que tinha peças inspiradas a histórias do mundo clássico e da idade romana imperial, mas com práticas de dança e de ginástica de carácter específico. Cf. “Teatro de La reina”, El diário redactor (26 Jan. 1859): 3-4.
26 Cf. Walter Goodman, Un artista en Cuba, 43.
27 Cf. Fernando Ortiz, Los cabildos y la fiesta afrocubana del día de Reyes (Havana: Editorial de Ciencias Sociales, 1992); Rine Leal, La selva oscura (Havana: Editorial arte e literatura, 1975), 77.
28 Cf. Virtudes Filiú Herrera, Fiestas y tradiciones cubanas (Havana: Instituto Cubano de Investigación Cultural Juan Marinello, 2003). Virtudes Filiú Herrera cita como fonte um artigo de A. García, mas a informação é confirmada pelo texto de um viajante italiano, Giovanni Francesco Gemelli Careri, que visitou Havana em 1697 e deixou uma descrição da festa já associando-a ao nome da festa de Carnaval: “[…] el domingo 9 de febrero los negros y mulatos, con pintorescos atuendos, formaron una congregación para divertirse en el carnaval”. Giacinto Ghirlanda, Gianfrancesco Gemelli – Careri e il suo viaggio intorno al mondo (1693-1698), (Verona: Tip. Paderno, 1899).
29 Para os etnólogos cubanos Alejo Carpentier e Fernando Ortiz, esta é sem dúvida a música mais popular de Cuba ao longo dos séculos; este ritmo tem uma ligação indubitável com o Carnaval brasileiro, os desfiles do Maracatu, o carnaval haitiano e angolano, e representa por isso até hoje a entrada dos ritmos africanos na sociedade cubana colonial.
30 Aline Helg, Lo que nos Corresponde: a lucha de los negros y mulatos por la igualdad en Cuba, 1886-1912 (Havana: Ediciones Imagen Contemporánea, 2000).
31 Ibid.
32 Alejandro de La Fuente, “Myths of racial democracy: Cuba, 1900-1912”, in Latin American Review 34, n.º 3 (1999): 39-73. 33 Cf. Aline Helg, Lo que nos corresponde.